Nos anos 1990, logo após lançar o livro A Gangue e o 5S, era comum professores me pedirem para, em palestra a estudantes adolescentes, reforçar que não se pode sair fazendo o que se quer. Os professores tinham seus motivos. Os adolescentes tinham os motivos deles.
Professores estavam incomodados com a indisciplina, perturbação em aula, falta de dedicação ao estudo, gravidez na adolescência, aids, bullying, drogas, vandalismo. Entendiam que eu poderia contribuir, já que meu livro trata exatamente de grupos de pichadores, que é uma forma de vandalismo. No livro, grupo de pichadores se torna grupo de estudo e de defesa do meio ambiente.
Na adolescência, idade de grandes transformações do corpo e da mente, pode se ter fé em estar fazendo a coisa correta e ser severamente condenado pelos mais velhos. Fé é assim mesmo: é ter certeza de que é certo sem evidências certas para a certeza. Certeza de que não vai engravidar, que não vai contrair aids, por exemplo. Certeza de que sabe dirigir bem e pega a chave e carro dos pais para corridas na madrugada.
O máximo que eu podia dizer àqueles adolescentes era baseado em minha própria experiência como adolescente e, no trabalho, na liderança de aprendizes. No final da infância, minhas percepções sobre incompatibilidade da fé pregada pelos mais velhos e a conduta deles me deram insegurança sobre o que acreditar ou não. Com isso, fui cauteloso, pensando mais antes de agir. Precisava verificar se as ideias que eu tinha podiam ser realizadas. Assim me permiti ter fé em o que parecia difícil, irreal. Em situações assim, a fé é importante para não desistir, para se organizar bem, de modo a poder dedicar inteligência e criatividade ao projeto difícil de realizar. Essa linha de pensamento contribuiu para eu poder escrever A Gangue e o 5S à noite, em época que o trabalho durante o dia era intenso e exaustivo. E essa linha de pensamento permeou a conduta dos personagens do livro.